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Mostrando postagens de março, 2017

GEOLOGIA

Carolina Geaquinto “Ciência cujo objeto é o estudo da origem, da formação e das sucessivas transformações  [...]” (Novo Dicionário Eletrônico Aurélio, 2004) Minha irmã já foi palmeira. Eu, rocha. Mais precisamente já fui o morro Pão de Açúcar. Não tenho dúvidas. A explicação é genealógica, meu pai se chama Pedro que, como se sabe, vem do latim que veio do grego que veio possivelmente da palavra aramaica para pedra – Kepha. Minha mãe se chama Alvanir, um sinônimo de alvanel – aquele que constrói, pedreiro – que vem do árabe al-banná. Até aí nenhum mistério, isso está no dicionário e na minha certidão de nascimento. Não sei por que minha irmã saiu palmeira, deve ser por isso que ela é a mais alta e a mais morena da família.  Vindo da pedra e do pedreiro, surgiu eu, Carolina. Reza a Wikipedia que Carolina é a versão latinizada do germânico karl – que significa homem forte – e lind – doce. E nascida no dia do padeiro, só posso ter sido o Pão de Açúcar. Feita de carnadura

MEL

Eliana Gesteira Estava à espreita no parapeito da janela desde o início da manhã, até que resignada acabou indo se sentar na almofada jogada no fundo da sala. Lá não ficou nem cinco minutos. Andou daqui para ali, percorreu os vãos entre as cadeiras e, por fim, se agachou e colocou a cabeça no chão para chorar. Depois de um tempo, a barriga roncando, procurou alguma coisa para comer, mas como a comida não lhe apetecia, acabou indo dormir. Ao se deitar de lado, viu no assoalho um brinquedo que foi mastigado sem muito entusiasmo, o que a levou a fazer uma coisa da qual muito gostava, que era brincar consigo mesma. Então coçou a orelha, se cheirou, mordeu um dedo, coçou a barriga e enfim enfiou a cabeça entre as pernas, posição em que ficou por quase uma hora, pois assim se sentia muito confortável.  De repente percebeu um perfume no ar. Levantou num salto e correu em direção ao quarto, onde parou um instante antes de decidir se subia na cama ou mexia nos chinelos largados emba

HÁ UMA INTERDIÇÃO

Angela Fleury É preciso encarar o bicho, não vamos controlar tudo, não vai dar. É preciso encarar o desamparo, o terror e entender que a vida que nos cerca é terrível. É preciso encarar o bicho. Estamos desamparados dentro de um barco no meio de um mar revolto. E o pior, somos por dentro um mar revolto. Estamos perdidos e sozinhos numa noite escura. O chão se move, as paredes balançam e o teto está nervoso. Não há como fixar, estabilizar, estancar, voltar atrás e suspender a viagem. Não quero mais, mudei de ideia, não quero mais, não, não vai ter jeito, é preciso encarar o bicho.  Mas, tudo bem. Não é preciso mesmo dominar as coisas da vida, não é preciso voar até Júpiter, roubar os anéis de Saturno, descobrir outras galáxias, saber de onde viemos e para onde vamos, não é preciso viver 200 anos, desvendar a vida após a morte, ir e voltar pra contar, descobrir as manhas do cosmo, não, não é possível. Não temos como negar, há uma interdição.  Há um limite a partir do qual n