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Mostrando postagens de agosto, 2015

(AINDA ) É PRECISO AMAR BIANCA

Julia Viegas Lua cheia, estrelas. Muitas. Noite alta, teto, chão, cama... Abro os olhos e ela não está mais lá. Ainda é preciso. Iso, iso, isso. Viro de lado, levanto devagar. Tropeço no móvel, pegou o dedinho. Uivo, como dói. Alcanço interruptor. Clique, clique. Não funciona. Será que cortaram por falta de pagamento? A imagem se desfaz, pois não é a mesma Bianca de antes. Aquela que vivia dura que nem coco. Ela (eu) cresceu, apareceu, virou executiva de multinacional, presidente de empresa. Certas Biancas ficaram para trás... Quando já acostumada com a escuridão,  fiat Lux . Era apenas mal contato. Acho. O abajur acendeu. Faz desenhos de flores no chão, reflexos e sombras. Abro a terceira gaveta, a que era dela. De tudo que vivemos, ficou uma meia calça, que ela nunca buscou. E provavelmente não buscará. Como era bela! Só tinha a juventude. Lembrava a mim, quando não havia cartão de crédito, status e pressões. Quando eu não tinha um sobrenome. Meus seios, cintura, quadris, l

SAPATOS PARA QUE TE QUERO

Sonia Andrade Não há nada que exerça maior fascínio sobre as mulheres do que sapatos. Simples peça de vestuário, que deveria apenas complementar o visual feminino, tornou-se objeto de desejo da maioria. Se só temos dois pés, porque precisamos de tantos sapatos? Difícil saber. Atire o primeiro chinelo a mulher que nunca se pegou olhando para o armário repleto de pares, em  dúvida sobre qual escolher  no  momento. Desde crianças ouvimos contos de fadas, como o da Cinderela, em que o Sapatinho de Cristal é personagem quase mais importante que o Príncipe. Afinal, ele só aparece na história por causa do sapatinho perdido pela princesa. Imelda Marcos, esposa de um ex-ditador das Filipinas, ficou famosa por causa dos seus incontáveis pares de sapato que teve que deixar para trás quando fugiu para o exílio. Abandonar os sapatos parece ter sido mais doloroso para ela do que deixar o  país. A primeira peça do enxoval do bebê costuma ser, simbolicamente, o sapatinho de tricô feito pela

OS HOMENS E SUAS PAIXÕES

Ana Paula Cruz Geraldo era um rico fazendeiro de uma cidadezinha do interior. Um senhor distinto e muito respeitado no meio rural onde vivia. Casado há mais de 40 anos com a mesma mulher, ele dizia que vivia um eterna lua de mel com sua patroa. Ele costumava viajar muito, sempre a trabalho. O que ninguém sabia, era o fato de que Geraldo gostava de viver suas aventuras fora de casa. Nas cidades por onde passava, tinha a fama de ser galanteador, ou melhor ''véi enxerido'' como muitas moças costumavam chama-lo. Ele era vidrado por um rabo de saia, e pasmem, só se interessava por mulheres jovens. Numa bela manhã de sábado, Geraldo estava pronto para mais uma viagem, arrumou suas malas, deu um beijo na patroa e seguiu seu caminho. Ao chegar no seu destino final, ele encontrou a sua paquera preferida: Ritinha. Ela é a dona da pensão onde Geraldo costumava se hospedar. Quando ele a viu, mal conseguiu tirar os olhos de seu decote. Ela vestia um vestido vermelho c

AOS MENINOS GENTIS

Vaneska M. Ela é tão essencial para as mulheres que nem deveria ser chamada de acessório. Não há registro histórico de mulher alguma, nem mesmo a mais hippie ou desapegada que não tenha seu modelo preferido e não tenha ao menos umas três penduradas pela casa. Há mulheres obcecadas por elas, acumuladoras. Muitas as carregam repletas de simbologias. Muitas as ostentam como prêmios. De ombro, a tiracolo, tipo mochila, de couro, parecendo couro. Barata, responsável por endividamento de meses, neutra, colorida, exótica. Seja como for, ela, a bolsa, é quase uma extensão feminina. Se a bolsa é da mulher, é em seus femininos ombros, antebraços ou mãos que ela deveria sempre estar. Somos fortes pra isso. A visão de um gentil menino, carregando a bolsa de sua eleita, sempre me causa desconforto e estranhamento. A linda bolsinha de repente vira algo monstruoso, deslocado, um corpo estranho muito estranho. E o que dizer do pobre rapaz? Em ombros errados, aquela enorme bolsa em ve

O ANIVERSÁRIO AZUL

Elisa Maria Rodrigues Sharland Ela saiu devagar, esvoaçante e feliz, iria encontrar aquele, que acreditava ser, seu primeiro amor. Era o dia de seu aniversário e tinha certeza de que não havia nada mais festivo e merecedor de celebrações do que amores e aniversários. Os dois num único dia! Era o primeiro encontro. Aquele que tinha sido tão desejado e sonhado por mais de dois anos. Agora se tornaria realidade. Quanta expectativa... O que seria que a esperava?  Haviam marcado o encontro num restaurante que ela não conhecia. Sabia que não teria nenhum problema, o restaurante ficava numa das ruas mais movimentadas da cidade e perto do Teatro Municipal. Quando lá chegou, sua respiração quase parou, surpresa pela beleza e suntuosidade do lugar. Lustres de cristal brilhavam, dançando com a iluminação que, delicadamente, decorava o imenso salão. As mesas, elegantemente arrumadas, com tantos talheres, pratos, taças e flores que quase se sentiu uma princesa, pronta

A CAMISOLA

Eliana Gesteira O silêncio preenche tudo. De repente um barulho. Uma cabeça branca se estica, mas só consegue ver um carro desaparecer na esquina. Olhos miúdos e frustrados vagueiam sem interesse e, sobre braços cruzados na janela, esperam.  Cansados, eles se voltam para dentro, deixando sem vigilância a rua de poucas casas e muitas árvores.  Mãos ossudas resolvem então pegar uma flanela e passar entre os espaços vazios de cadeiras empoeiradas. Findado o serviço, olhos e mãos se juntam para conferir os móveis e, estando ambos satisfeitos, uma senhora se apruma, toma um banho, almoça e resolve tirar o cochilo habitual.  A senhora desperta e retorna à sala, arrastando seus chinelos de pano. Ela senta no sofá e entre almofadas gastas e puídas procura o controle remoto para ligar a televisão. Não demora mais do que cinco minutos e se levanta: — “Definitivamente, não há nada que preste”, resmunga. Caminhando lentamente chega ao quintal. Lá dá uma espiada no céu para

IDENTIDADE

Angela Fleury Nossa identidade, quem somos, do que gostamos e qual é o nosso lugar nesse mundo, não diz respeito somente a nós mesmos. Ela é parte fundamental de nossa interação com o mundo e orienta a maneira como as outras pessoas se comportam diante de nós. O modo como nos apresentamos e nos expressamos reforça nossa identidade e determina como seremos tratados. Aquilo que, por exemplo, inicialmente pode parecer uma decisão simples e corriqueira, como a escolha de como iremos nos vestir, termina por determinar se seremos ou não aceitos em diferentes grupos sociais, se conseguiremos esse ou aquele emprego, se somos merecedores de promoção e respeito ou de desprezo. Nossas decisões e escolhas terão consequências psicológicas, sociais, políticas e econômicas. Uma simples peça do vestuário pode significar respeito para uns e opressão para outros. É o caso do véu islâmico, conhecido como Hijab, que usado pelas mulheres muçulmanas no Ocidente, como parte da fé Islâmica, vem se