A MULHER QUE AMAVA AS PALAVRAS
Carolina Geaquinto
Machado de Assis ensina que as palavras têm sexo, amam-se umas às outras, casam-se. O casamento delas é que se chama estilo. E o casamento de uma pessoa com uma palavra, como se chama?
Machado de Assis ensina que as palavras têm sexo, amam-se umas às outras, casam-se. O casamento delas é que se chama estilo. E o casamento de uma pessoa com uma palavra, como se chama?
De vez em quando, me vem à cabeça uma palavra
que não sei direito o que quer dizer. Resolvo logo ir ao dicionário, o fiel
companheiro, ainda que às vezes traiçoeiro. Pois um dia resolvi procurar “chorumela”
(não me pergunte por quê...).
Acabei descobrindo que, primeiro, “chorumela”
pode ser uma coisa de pouco valor, uma ninharia. Mas o sentido que estava
realmente procurando, aquele da expressão “não me venha com chorumelas” é o que
está registrado como um regionalismo do Rio Grande do Sul, ou seja, um discurso
monótono, uma lengalenga (outra palavra muito divertida).
Mas eis que, no meio do caminho, quer dizer,
das páginas, encontrei “chumbregar”. Foi paixão à primeira vista! Essa
sonoridade extravagante, brega mesmo como está na própria palavra, me encantou.
Mas não para aí: por acaso você conhece outra palavra que pode significar beber
em demasia, namorar lascivamente e encher o saco dos outros? Também pode
significar “matar”, como descobri depois e, apesar de desprezar um pouco essa
acepção, não deixa de ser uma palavra icônica, saborosa, pra a qual enchemos a
boca ao pronunciá-la.
Se disser que quero chumbregar, não há como
saber se vou beber, transar, importunar alguém ou cometer um crime. Quer dizer,
desde que não se saiba o contexto: um boteco, uma cama ou no trabalho – local
propício pro emprego das duas últimas acepções. E desde que não se saiba também
de onde eu sou, pois cada sentido depende de uma região do país, seja o Norte,
Nordeste ou Sudeste. Como sou de Brasília — felizmente, neste caso — posso chumbregar
em qualquer ocasião.
Chumbregar
se
apoderou de mim de tal maneira que quis saber de onde vinha essa maravilha da
língua brasileira, queria saber se o nosso casamento ia dar mesmo certo.
Descobri que é de origem alemã e descobri também que é um epônimo, pois foi um
tal de Friedrich Hermann Schönberg que, por sua elegância, vaidade com os bigodes
e disponibilidade pra uma boa farra, acabou virando palavra lá em Portugal do
século XVII. Na mesma época, a palavra se popularizou no Brasil a partir de um
governador de Pernambuco, muito odiado, por todas as mesmas razões que os
políticos ainda hoje são odiados no Brasil. Era um janota, como o Collor, e um
fanfarrão, como o Sérgio Cabral. Os tempos mudam, as palavras se transformam,
mas as pessoas...
Muitas googladas
depois, continuei sem saber como se chama a união voluntária entre uma pessoa e
uma palavra, se é que existe um termo pra isso. Só sei que gosto de chumbregar
com as palavras, de chumbregar as palavras entre si, mas não dá pra ficar só
com uma. Afinal, assim como há muitos peixes no mar, há muitas palavras no
dicionário.
Carolina, que abordagem interessante! Realmente, as palavras ganham notas de acordo com o gosto do usuário. O histórico de chumbregar vindo parar em Pernambuco é ótimo.Você acaba de dar uma ideia divertida para um bom exercício!
ResponderExcluirChumbregar: como esquecer? Só se chumbregar muito no buteco hehehe
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